Carl Theodore Dreyer era nove anos mais velho que Sergei Mikhailovich Eisenstein, começou no cinema seis anos antes dele e sobreviveu-lhe 20 anos.
Com o seu primeiro filme, "O Presidente", datado de 1919, Dreyer fez uma audaciosa transição entre o cinema mudo e o sonoro, com "La passion de Jeanne d'Arc" (1928) e "Vampyr" (1932) enquanto Eisenstein, que tinha começado em 1925 com "A Greve", resistiu ao sonoro contra o qual subscreveu um manifesto. Depois de "A Linha Geral ou O Velho e o Novo" (1929) e do controverso "Que Viva Mexico!" (1931/32) não conseguiu concluir o seu projectado e iniciado filme seguinte, o mítico "O Prado de Béjine", por razões censórias, só em 1938 tendo podido realizar "Alexandre Nevski".
Quer isto dizer que fizeram ambos poucos filmes por razões diferentes, um porque assim o quis, o outro porque foi o que lhe foi permitido fazer. Mas trazê-los aqui um contra o outro parte do entendimento do cinema que cada um deles teve, Dreyer baseado na realidade, Eisenstein a partir da imagem e sobre ela, sem por isso o primeiro deixar de acreditar na imagem da realidade e o segundo na realidade da imagem.
No seu cinema, influenciado por Soren Kierkegaard o cineasta dinamarquês criou filmes que se destacava uma dimensão ética, a da alternativa do espírito e da consciência da escolha, como escreve Gilles Deleuze em "A Imagem-Movimento", em que utilizou simples elementos da realidade, nomeadamente da cenografia para visitar épocas diferentes, como em "Dies Irae", "Ordet" e "Gertrud", retirando o melhor e maior efeito do tratamento de elementos realistas.
Por seu lado, a partir do marxismo e da pintura europeia pós-renascentista e chinesa, Sergei Eisenstein criou filmes com uma poderosa carga materialista altamente elaborados, em que a composição da imagem nos seus elementos plásticos e na montagem transfigurava a realidade na transposição fílmica para se tornar mais convincente em termos visuais e artísticos.
Mais tarde Eisenstein veio a adoptar um tratamento contrapontístico do som nos seus filmes sonoros, em que estava em causa também a plasticidade dos sons, nomeadamente da música de Sergei Prokofiev em "Alexandre Nevski" e "Ivan, o Terrìvel".
Mas não apenas isso. Enquanto Dreyer usava o plano-médio e o grande plano ou planos de espaços vazios, Eisenstein usou o plano-geral, o grande-plano e o plano de pormenor com inteira consciência estética, a mesma que o levou a inaugurar no cinema o uso da secção de ouro, que também teorizou, e a montagem com inteiro intuito político.
Enquanto um apelava para a interioridade do espectador com narrativas em que se contrapunham encarnações, nem sempre as mais óbvias, do bem e do mal, o outro jogou com a situação política em que trabalhou nos anos 20 apelando aos grandes sentimentos das massas, no limite franqueado do cinema de propaganda - fez "Outubro" para o 10º aniversário da revolução de Outubro de 1917.
Como se cineasta oficial do regime soviético, Eisenstein caiu em desgraça nos anos 30, durante os quais teve uma vida dedicada ao ensino do cinema e à escrita, enquanto Dreyer trabalhava sem dificuldades em diversos países europeus. Mas aproximou-os trabalharem ambos a preto e branco e serem ambos argumentistas dos seus próprios filmes. Já os planos curtos, os contrastes da imagem e a elaboração da profundidade de campo no primeiro contrastaram com os planos longos, os cinzentos e a profundidade de campo limitada no segundo.
A morte de Eisenstein aos 50 anos privou-nos de um génio do cinema que teria noutras condições podido ir muito mais longe mas mesmo assim nos deixou uma obra cinematográfica e teórica da maior importância. Dreyer morreu com 79 anos, depois de ter completado filmes que se contam entre os mais relevantes do cinema no século XX, tendo podido criar à medida que envelhecia e visto despontar outros ao seu nível por ele influenciados, como Ingmar Bergman e Robert Bresson.
Mas tal como a vida, o cinema não é um longo rio tranquilo e a sua evolução permite detectar as grandes injustiças e os grandes benefícios. Embora a fama intelectual tenha tendido a beneficiar Eisenstein, Dreyer não lhe foi de maneira nenhuma inferior. Vejam os filmes de ambos, que se contam entre o melhor cinema de sempre.
Amem ou odeiem não lhes podem ficar indiferentes. Eu gosto de ambos mas é mais fácil preferir um contra o outro. A riqueza do cinema está na sua grande diversidade, o que deve ser apreciado e levar a que se conheça tudo o que nele interessa, em especial o que foi decisivo na sua história e na sua estética como é o caso destes dois imensos cineastas..
No seu cinema, influenciado por Soren Kierkegaard o cineasta dinamarquês criou filmes que se destacava uma dimensão ética, a da alternativa do espírito e da consciência da escolha, como escreve Gilles Deleuze em "A Imagem-Movimento", em que utilizou simples elementos da realidade, nomeadamente da cenografia para visitar épocas diferentes, como em "Dies Irae", "Ordet" e "Gertrud", retirando o melhor e maior efeito do tratamento de elementos realistas.
Por seu lado, a partir do marxismo e da pintura europeia pós-renascentista e chinesa, Sergei Eisenstein criou filmes com uma poderosa carga materialista altamente elaborados, em que a composição da imagem nos seus elementos plásticos e na montagem transfigurava a realidade na transposição fílmica para se tornar mais convincente em termos visuais e artísticos.
Mais tarde Eisenstein veio a adoptar um tratamento contrapontístico do som nos seus filmes sonoros, em que estava em causa também a plasticidade dos sons, nomeadamente da música de Sergei Prokofiev em "Alexandre Nevski" e "Ivan, o Terrìvel".
Mas não apenas isso. Enquanto Dreyer usava o plano-médio e o grande plano ou planos de espaços vazios, Eisenstein usou o plano-geral, o grande-plano e o plano de pormenor com inteira consciência estética, a mesma que o levou a inaugurar no cinema o uso da secção de ouro, que também teorizou, e a montagem com inteiro intuito político.
Enquanto um apelava para a interioridade do espectador com narrativas em que se contrapunham encarnações, nem sempre as mais óbvias, do bem e do mal, o outro jogou com a situação política em que trabalhou nos anos 20 apelando aos grandes sentimentos das massas, no limite franqueado do cinema de propaganda - fez "Outubro" para o 10º aniversário da revolução de Outubro de 1917.
Como se cineasta oficial do regime soviético, Eisenstein caiu em desgraça nos anos 30, durante os quais teve uma vida dedicada ao ensino do cinema e à escrita, enquanto Dreyer trabalhava sem dificuldades em diversos países europeus. Mas aproximou-os trabalharem ambos a preto e branco e serem ambos argumentistas dos seus próprios filmes. Já os planos curtos, os contrastes da imagem e a elaboração da profundidade de campo no primeiro contrastaram com os planos longos, os cinzentos e a profundidade de campo limitada no segundo.
A morte de Eisenstein aos 50 anos privou-nos de um génio do cinema que teria noutras condições podido ir muito mais longe mas mesmo assim nos deixou uma obra cinematográfica e teórica da maior importância. Dreyer morreu com 79 anos, depois de ter completado filmes que se contam entre os mais relevantes do cinema no século XX, tendo podido criar à medida que envelhecia e visto despontar outros ao seu nível por ele influenciados, como Ingmar Bergman e Robert Bresson.
Mas tal como a vida, o cinema não é um longo rio tranquilo e a sua evolução permite detectar as grandes injustiças e os grandes benefícios. Embora a fama intelectual tenha tendido a beneficiar Eisenstein, Dreyer não lhe foi de maneira nenhuma inferior. Vejam os filmes de ambos, que se contam entre o melhor cinema de sempre.
Amem ou odeiem não lhes podem ficar indiferentes. Eu gosto de ambos mas é mais fácil preferir um contra o outro. A riqueza do cinema está na sua grande diversidade, o que deve ser apreciado e levar a que se conheça tudo o que nele interessa, em especial o que foi decisivo na sua história e na sua estética como é o caso destes dois imensos cineastas..
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