sexta-feira, 21 de junho de 2019

Isto ainda vai acabar mal

   "Os Mortos Não Morrem"/"The Dead Don't Die" de Jim Jarmusch (2019) é mais um grande filme do nome maior do cinema independente americano. Seguindo na esteira de "Só os Amantes Sobrevivem"/Only Lovers Left Alive" (2013), dele recupera a temática, agora com zombies, e a actriz principal, Tilda Swinton.
   Em Centerville, "um belo lugar" na América, em consequência de alterações climáticas que levaram a que a Terra saísse do seu eixo, começam a acontecer coisas estranhas: o sol põe-se a desoras, aparecem animais mortos ou fora do seu sítio e sobretudo os mortos do cemitério voltam à vida.
   Os polícias encarregados do caso, o Chefe Cliff Robertson/Bill Murray (de "Broken Flowers - Flores Partidas"/"Broken Flowers", 2005), o agente Ronnie Peterson/Adam Driver (de "Paterson", 2016) e a agente Mindy Morrison/Chloé Sevigny, os únicos da pequena localidade, fazem o que podem com os conhecimentos que adquirem no próprio local, nomeadamente no restaurante e na loja de bugigangas locais, enquanto a dona da agência funerária local, Zelda Winston/Tilda Swinton, tenta fazer pela vida. 
   Há ainda o eremita Bob/Tom Waits, que encontra um livro, "Moby Dick" de Herman Melville, debaixo de folhas e de terra, três jovens turistas e duas crianças numa população que morre mas não morre. A receita para acabar com os mortos-vivos é cortar-lhes a cabeça, no que Zelda com a sua espada é perita. 
                       Dead Don't Die
    Para além das referências cinematográficas, que partem de "Nosferatu, O Vampiro"/"Nosferatu, eine Symphonie des Grauens", de F. W, Murnau (1922), as alusões políticas vão mais longe que nos filmes de George A. Romero, também citado, numa organização fílmica que se move muito bem entre o diegético e o extra-diegético, especialmente na música e com os dois protagonistas, actores que leram coisas diferentes do argumento.
   "Os Mortos não Morrem", no original o título de uma canção de Sturgill Simpson, é mais uma peça inteligente e muito boa na obra de um dos mais importantes cineastas americanos da actualidade, 
    Com argumento do realizador, fotografia Frederick Elmes e montagem de Affonso Gonçalves, este filme não é uma crítica superficial mas profunda da América contemporânea. A crítica será a arte de amar sobretudo quando está em causa um filme que pratica a crítica como arte de amar, radicalmente crítico como este é. Oiçam bem a voice over final e escutem bem a música durante o genérico de fim, depois de Zelda ter regressado às origens e tudo estar consumado.
    Claro que se pode reconhecer pessimismo nos sinais que anunciam o fim do mundo, mas pelos vistos não andamos muito longe disso se não formos todos a tempo de reverter situações climáticas que parece ainda não serem irreversíveis. Como filme de zombies este último de Jim Jarmusch arranca gargalhadas da assistência, em que deve sobretudo provocar má consciência.

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