No seu muito aguardado "A Morte de Luís XIV"/"La mort de Louis XIV" (2016), o catalão Albert Serra constrói um admirável filme histórico, cinematográfico, teatral e pictórico sobre os últimos dias do rei que quase escapa às categorias deleuzianas de monumental ou de antiquário - está do lado deste quase sem se notar.
Com filmagens em locais belíssimos, este filme assume uma exploração cinematográfica parcelar de espaços e figuras, com especial relevo para o grande-plano e com uma iluminação que deixa recortada uma escassa porção visível do plano, rigorosamente definida.
A escuridão que assim rodeia o rei na sua câmara funerária antecipada torna mais salientes cada uma das personagens, cada palavra e entoação, cada movimento ou atitude ainda que escassamente esboçados. O plano fixo e longo define uma perspectiva temporal e um ritmo pausado, atento que convida à contemplação.
Depois das ainda galantes conversas iniciais de LuÍs XIV, assistimos aos esforços dos médicos, às palavras do rei para o seu sucessor e à sua determinação sobre o futuro do seu coração (ao lado do do seu pai e antecessor), à progressiva degradação do seu estado de saúde até ser atingido pela gangrena numa perna. Depois, numa sequência longa e belíssima sem disso nos darmos conta assistimos ao seu último suspiro, de que tomamos conhecimento com os presentes no seu quarto pelo anúncio clínico: "Le Roi est mort".
Neste filme fúnebre em que o corpo, em especial o do rei assume pleno relevo e que acaba com a exposição das vísceras reais tudo passa pela parte visível de cada actor, normalmente o rosto, em cada momento, pela expressão e pelas escassas palavras. Sem outros ruídos e com muitíssimo escassa música diegética, "A Morte de Luís XIV" de Albert Serra é um excelente filme, com a exigência a que ele já nos habituou - "Honra de Cavalaria"/"Honor de cavalleria" (2006), "O Canto dos Pássaros"/"El cant dels ocells" (2008), "El Senyor ha fet en mi meravelles" (2011) e "História da Minha Morte"/"Història de la meva mort" (2013).
Com argumento de Thierry Lounas e de Albert Serra, fotografia de Jonathan Ricquebourg, Jean-Pierre Léaud com uma interpretação invulgar e memorável centrada no rosto e todos os actores, entre os quais José Wallenstein e Filipe Duarte, perfeitos, pela produção deste filme é responsável a francesa Capricci, que eu acho que devem conhecer e encontram aqui
www.capricci.fr/
Este filme deve ser ligado com "A Tomada do Poder por Luís XIV"/"La prise du pouvoir par Louis XIV", de Roberto Rossellini, com que o cineasta em 1966 iniciou o seu trabalho final para a televisão. E será uma bela dupla de vida e morte do mítico Rei Sol.
A retrospectiva instalações que está até 29 de Janeiro no Palácio Pombal, no Bairro Alto, com curadoria de Alexandre Melo, dá uma outra medida do grande talento de Albert Serra e da diversidade das suas manifestações - atenção em especial a "Singularity" (2015), que passa simultaneamente em cinco ecrãs diferentes - com uma especial atenção ao corpo como dimensão fulcral - "Da humanidade à matéria, da matéria à máquina". Juntamente com a retrospectiva que a Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema com "carta branca" lhe dedicou, podemos ter uma perspectiva completa sobre o grande cineasta e artista catalão de quem não consegui ver a performance.
Abstinência total de rigor para palhaços portugueses do "ir de encontro" e "ter a haver".
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Este filme deve ser ligado com "A Tomada do Poder por Luís XIV"/"La prise du pouvoir par Louis XIV", de Roberto Rossellini, com que o cineasta em 1966 iniciou o seu trabalho final para a televisão. E será uma bela dupla de vida e morte do mítico Rei Sol.
A retrospectiva instalações que está até 29 de Janeiro no Palácio Pombal, no Bairro Alto, com curadoria de Alexandre Melo, dá uma outra medida do grande talento de Albert Serra e da diversidade das suas manifestações - atenção em especial a "Singularity" (2015), que passa simultaneamente em cinco ecrãs diferentes - com uma especial atenção ao corpo como dimensão fulcral - "Da humanidade à matéria, da matéria à máquina". Juntamente com a retrospectiva que a Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema com "carta branca" lhe dedicou, podemos ter uma perspectiva completa sobre o grande cineasta e artista catalão de quem não consegui ver a performance.
Abstinência total de rigor para palhaços portugueses do "ir de encontro" e "ter a haver".
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