sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

Boas vibrações

    "La La Land: Melodia de Amor"/"La La Land", de Damien Chazelle (2016), é um filme musical surpreendente por não se querer parecer com nada nem na história do cinema nem na actualidade.
    Ao escolher uma indefinição temporal que tanto pode ser passado como presente, o cineasta, também argumentista envereda por um caminho raro que desafia o cinema e nos desafia como espectadores, no que se sai muito bem com as referências radiculares dos posters de filmes e a citação de "Fúria de Viver"/"Rebel Without a Cause", de Nicholas Ray (1955) na sequência do planetário como apropriações que fazem sentido.
                   
   Com elementos tirados do musical clássico e do musical moderno americano do pós-guerra, de que recupera o carácter de género estúdio e o onirismo (Vincente Minnelli) acaba por recordar em especial "Os Chapéus de Chuva de Cherbourg"/"Les parapluies de Cherbourg" de Jacques Demy (1963) pelo canto e pelo final - que lembra o de "Café Society", de Woody Allen (2016), o que joga a favor de ambos - sem se afastar do seu grau de abstracção que um maior proximidade impediria.
  "La La Land: Melodia de Amor" tem presente uma narrativa que se pretende intemporal e números dançados e cantados que são bem coreografados e bem interpretados com Ryan Gosling como Sebastien, pianista, e Emma Stone como Mia, aspirante a actriz - especialmente interessante a personagem masculina com excelente interpretação. A questão do jazz clássico e do jazz moderno, com Damon Gupton como Harry, está bem enunciada sem brilhantismo na demonstração, pelo que funciona sobretudo como referência narrativa.
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   Embarcados e embalados pelo ritmo próprio do filme e empurrados pela sua lógica e pela sua estética onírica, são-nos oferecidos belos momentos musicais cantados e dançados - e não estamos longe do melhor da história do musical como género maior do cinema americano, o que não acontecia num passado recente nem mesmo nos melhores casos. 
    A música é de Justin Hurwitz, a fotografia de Linus Sandgren e a realização de Damien Chazelle cumpre com brio as suas influências expressas para as superar em inventiva visual e sonora, em novidade coreográfica e depuração fílmica, dando origem a um filme exuberante e evocativo, belo e melancólico que marca uma data no cinema americano.
   Com o regresso do musical assiste-se, assim, ao prosseguimento da recuperação do naipe de géneros clássicos e modernos do cinema americano em termos de grande qualidade cinematográfica, o que é auspicioso e muito bem vindo num momento em que talvez só por aí e pelo cinema independente ele possa ressurgir. Dê-se tempo ao cineasta, ainda na sua terceira longa-metragem, para mostrar o que vale: se estamos perante um acaso feliz ou ele tem efectivamente algo de novo para nos dar (nem estamos nos anos 80 nem isto tem nada a ver com Baz Luhrmann).

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