quinta-feira, 11 de abril de 2019

O poço, seco

        O primeiro depois de "Sono de Inverno"/"Kis Uykusu" (2014) e o oitavo do mais proeminente cineasta turco da actualidade, multipremiado e um dos principais nomes do cinema dos nossos dias, "A Pereira Brava"/"Ahlat Agaci" é o mais recente filme de Nuri Bilger Ceylan (2018) que agora nos chegou.
       Apresenta-se como uma notável sucessão de diálogos de Sinan Karasu/Dogu Demirkel, que terminou um curso superior, quer publicar o seu primeiro livro e ser professor, com diversos interlocutores, entre os quais um presidente de câmara, uma amiga (Hatice/Hazar Ergüçlü), um escritor célebre, o pai (Idris Karasu/Murat Cemeir), a mãe (Asuman Karasu/Bennu Yldirimlar) e o pai em suspeita, um possível patrocinador do seu livro e, depois do serviço militar, os avós, um par de imãs, a mãe e o pai de novo para terminar. Tudo numa terra isolada, distante e perdida na Turquia.
      Mas todo o filme é extremamente bem construído visualmente, com frequente recurso ao grande plano e ao plano geral, com profundidade de campo mas também desfocagens notáveis numa mesma sequência. Ao que acrescem movimentos de câmara amplos e largos, com predomínio do travelling por vezes veloz.
                      Trailer português do filme A Pereira Brava
      A discussão religiosa para que o filme conflui faz lembrar os grandes debates religiosos em Carl Th. Dreyer e Ingmar Bergman sem prejudicar a fluidez da narrativa de um filme muito longo que muito escassa mas simbolicamente a música pontua. 
      Filme sobre a criação e a esterilidade, entre pai e filho persiste a busca de água no fundo do poço depois do sonho do segundo de uma fertilidade onírica. Aliás o filme decide-se entre homens apesar da importância das mulheres, a amiga e a mãe, até a avó do protagonista, e por esse lado a saída é a continuação da tentativa do progenitor.
      As árvores agitadas pelo vento durante a conversa com a amiga Hatice do início repetem-se do mesmo jeito apenas no sonho do final do protagonista. Mas a natureza seca move-se ao lado e por cima das personagens isoladas e solitárias.
      As belas reflexões que preenchem o filme dão-lhe um significado específico sem prejudicarem o desenvolvimento da narrativa, seca e dura, sem remissão mesmo com o apaziguamento subsequente ao conflito.
     Com argumento de Aken Aksu, Ebru Ceylan e Nuri Bilge Ceylan, tem fotografia de Göhkan Tiryaki e montagem do realizador.  Devo, contudo, dizer que à grandiosidade deste filme admirável prefiro o minimalismo de Abbas Kiarostami, embora reconheça que os dois cineastas estão ao nível um do outro.

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