sábado, 20 de abril de 2019

O sangue derramado

  "Anoitecer"/"Napszälita" (2018) é a segunda longa-metragem do húngaro László Nemes a seguir a "O Filho de Saul"/"Saul fia" (2015), um primeiro filme sério e importantes sobre a II Guerra Mundial. Mantém-se a seriedade sobre um tempo aparentemente frívolo, os anos que antecederam o início da I Guerra Mundial. E mantém-se sobretudo a estética, por surpreendente que seja.
  Herdeira de um nome mas já não de uma fortuna na indústria chapeleira, Írisz Leiter/Juli Jakab, a protagonista, surge na sede da empresa em Budapeste no início da semana em que esta celebra 30 anos de existência. Com o intuito de oferecer-se para ocupar um lugar de modista, é rapidamente afastada. Corre o início dos anos 10 do século XX, quando Viena era capital do Império Austro-Húngaro.
  Ela sabe entretanto da existência de um irmão desconhecido, que procura encontrar e encontra quando ele e o seu bando tentam um assalto com tentativa de homicídio. Pelo meio de outro mistério, uma mulher desaparecida, ela acaba por matá-lo, duas vezes até, a segunda durante a noite do fogo de artifício, depois de Sua Alteza Real e a Princesa, filhos de Francisco José e de Sissi, em pessoa terem visitado a empresa e feito as suas escolhas.
   O ambiente do Império Austro-Húngaro está muito bem recriado em arquitectura, vestuário e espírito, para o que contribui uma excelente fotografia com desfocagens frequentes do fundo, maiores e mais insistentes no fim, e a protagonista em plano aproximado, o que acentua o carácter afectivo do grande-plano apesar do uso do plano de trás, da nuca dela. Além disso a cãmara move-se constantemente e pululam no filme ruídos provenientes do fora de campo e o som está muito bem trabalhado em Dolby Digital.
  Com argumento de László Nemes, Clara Royer e Matthieu Taponier, tem fotografia de Mátiás Erdéli, música de László Melis e montagem de Matthieu Taponier. Seria difícil fazer melhor em filme de época, torna-se agora difícil imaginar diferente.
  Procurando deliberadamente o efeito artístico, László Nemes atinge-o sem que ele em desfocagens, enquadramento insistente, mobilidade de câmara e sons surja como gratuito, antes adequado ao espaço e ao tempo em que o filme decorre. O final, rápido, é já nas trincheiras.

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