quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Discutível

     "À Porta da Eternidade"/"At Eternity's Gate" de Julian Schnabel (2018) é mais um filme sobre Vincent Van Gogh, um artista moderno cuja vida tormentosa contrasta com a sua arte luminosa e por isso  tem chamado a atenção do cinema, nomeadamente em filmes de Vincente Minnelli (1956) e Maurice Pialat (1991).
    Com tudo o que um filme com este respeito é suposto ter nomeadamente a nível de interpretações - Willem Dafoe está notável -, a nível de argumento - de Jean-Claude Carrière, Julian Schnabel e Louise Kugelberg - e a nível técnico - fotografia de Benoît Delhomme, música de Tatiana Lisovkaia e montagem de Louise Kugelberg e Julian Schnabel -, mostra desde o início o propósito de dar o ponto de vista e a subjectividade do pintor, para o que se socorre frequentemente do plano subjectivo, o que está bem, mas também do permanente movimento da câmara, supõe-se que para dar a instabilidade psíquica dele, e essa é uma opção discutível e que a meu ver funciona mal.
    Trata-se de uma pura opção do cineasta, uma opção do realizador, que pretendendo ser audaciosa retira força à personagem de quem nada nos diz que a subjectividade fosse aquela e assim influenciasse a sua criatividade turbulenta, e enfraquece o filme porque obriga o espectador a acompanhar um movimento constante e gratuito da câmara.                  
                      
   E a figura de Van Gogh merecia um outro respeito, ele que no filme diz que pinta a luz do sol, pinta para não pensar e pinta para o futuro, o que constitui uma boa síntese da sua modernidade efectivamente solar, instintiva e difícil de aceitar para o seu próprio tempo, pelos seus contemporâneos.
   Tirando esta objecção de peso, "À Porta da Eternidade" de Julian Schnabel tem um bom trabalho sobre a escala dos planos, do grande plano - e no campo contra-campo a câmara está geralmente fixa, o que está bem - ao plano geral da paisagem rural, o que porém não oculta a imprecisão do espaço, tornado fluido e escorregadio em obediência a um propósito que se compreende mas não se concorda seja levado a este extremo até porque prejudica a percepção do espectador.
   Os outros actores estão todos muito bem - Oscar Isaac como Paul Gauguin, Rupert Friend como Theo Van Gogh, Mads Mikkelsen como padre, Mathieu Amalric como dr. Paul Gachet e Emmanuelle Seigner como madame Ginoux. Mas a questão não passa por aí.
   Com a preocupação de audácia e novidade, a meu ver Julian Schnabel prejudica o seu filme mais do que o beneficia. Mas percebo que possa haver quem goste. O que tornará este filme pelo menos discutível.

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